Uma
rápida incursão pela história recente do Brasil nos revela uma
inconsistência no que concerne aos planos de desenvolvimento levados
a efeito pelos governos, principalmente na esfera federal. Pensar o
Brasil, em toda a sua diversidade, reinventar as práticas diretivas
e trazer à discussão um projeto para a Nação brasileira, não fez
parte de uma agenda de governo dos grupos que se sucederam nos
últimos vinte anos de nossa recente história.
Nesses
dez meses do governo de Marcelo Déda estive, como
espectador/participante, aguardando pela definição de um conjunto
de políticas, próprias a um governo em início de gestão. Afora o
lugar comum de que é preciso dá tempo para o governo e de que não
se corrige erros históricos em tão pouco tempo, não fiz coro entre
os que apontavam para uma e outra situação. Apenas observei e fiz o
que julguei correto: observar, avaliar e acompanhar as ações. Agora
está na hora de falar. Falarei.
Tem
uma coisa que nunca entendi, ou acho que nunca quis entender: por que
um grupo político de um Estado tão pequeno, elabora um projeto de
chegar ao poder que se arrasta por mais de uma década, chega ao
poder e não tem um projeto de governo, um conjunto de ações
prontas para apresentar à sociedade? Que o grupo necessita de um
tempo para se “ familiarizar ” com a máquina administrativa é
admissível, mas que não tenha um projeto para contrapor ao (falta)
projeto anterior, é incompreensível!
A
única coisa que o bom senso me alerta é para o fato de que o
governo foi tomado de susto e que não existia um programa de governo
elaborado, cuidadosamente, e, que tudo foi se construindo ao longo
desses 10 meses. Aparentemente tudo normal, mas não é.
Não
usarei esse espaço para uma análise conjuntural do Governo Marcelo
Déda, pois não tenho condições técnicas, nem informações para
tanto. Mas, ocuparei esse espaço para realizar algumas reflexões a
respeito do lugar que a Cultura ocupa na gestão do atual governo.
Qual
é o nó que percebo no atual governo, até agora? A inexistência de
uma política cultural. Não me refiro a ações isoladas,
administrativas ou de eventos. Não, refiro-me àquele conjunto de
ações inspiradas em princípios que nortearão as ações públicas
em geral, pois não se concebe uma política cultural isoladamente;
não se concebe um conjunto de ações culturais dissociados das
demais ações.
A
cultura não é um substrato que possa ser abstraído e, com precisão
cirúrgica, proceder a reparos ou correções, como plástica
corrigindo rusgas. A cultura se constrói em um continuado movimento
da fazeres / afazeres dos povos, da comunidade, de grupos.
O
papel do gestor cultural, no âmbito do Estado, é compatível ao
papel do gestor econômico, administrativo, educacional, tributário,
etc. O gestor cultural, na esfera governamental, é um executivo das
políticas públicas, dos programas governamentais – quando esses
existem.
A
cultura sempre existiu, existe e continuará a existir, independente
de sistemas e formas de governos; a cultura existe apesar dos
governos.
A
simples existência de um Ministério da Cultura ou de uma Secretaria
de Cultura é uma prova inconteste da incompreensão do significado
da cultura.
Por
conceito, a cultura é trasministerial, nunca deveria existir uma
ação, onde quer que haja, seja qual for a esfera governamental, que
não contemplasse o alcance cultural dessa ação.
A
existência de um Ministério ou de uma Secretaria da cultura cria
uma situação, no mínimo esquisita, entre os gestores de outras
pastas: a de se achar que tal ou qual medida não afeta a vida
cultural de um povo; ou de se eximir dessas mesmas ações, pois,
afinal, existe a pasta da Cultura. Assim, esses entes
administrativos se tornam em agentes públicos de promoção de
eventos e espetáculos, quando muito de promotores de ações que
contemplam o interesse de um determinado segmento.
Quanto
de recurso público seria necessário e ideal para uma pasta da
cultura? O muito seria pouco e o pouco pode ser incrivelmente muito!
Imaginemos
uma situação: se cada município brasileiro resolvesse reivindicar
uma biblioteca, um teatro, um museu, um arquivo, quanto seria
necessário para a implantação desses bens culturais? Quanto seria
necessário para sua manutenção em todos os municípios? Com
certeza que bem mais que os orçamentos destinam para a cultura.
Agora
imaginemos outra situação: se os governos resolvessem investir em
grupos folclóricos, em manifestações populares as mais variadas,
entre outros, quanto que seria necessário? Bem menos do que o que se
gasta hoje.
Dessa
forma, a questão orçamentária, sem minimizá-la, mas é apenas uma
questão, sem ao menos ser a mais importante das questões para a
gestão da cultura. Falarei sobre o orçamento para a Cultura em
outro artigo.
Aracaju,
junho de 2008
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